sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Imitação de Cristo III - Cap. 26 - Excelência da liberdade espiritual, à qual se chega antes pela oração humilde que pela leitura



A ALMA: Senhor, é próprio do varão perfeito: nunca perder de vista as coisas celestiais, e passar pelos mil cuidados, como que sem cuidado, não por indolência, mas por um privilégio duma alma livre, que não se apega, com desordenado afeto, a criatura alguma.

Peço-vos, ó meu benigníssimo Deus! Preservai-me dos cuidados desta vida, para que não me embarace demasiadamente neles; das muitas necessidades do corpo, para que não me escravize a sensualidade; e de todas as perturbações da alma, para que não me desalente sob o peso das angústias. Não falo das coisas que a vaidade humana busca tão empenhadamente, mas das misérias que, pela maldição comum de todos os mortais, penosamente oprimem a alma de vosso servo, e a impedem de elevar-se à liberdade perfeita de espírito, sempre que o quiser.

Ó meu Deus, doçura inefável! Convertei-me em amargura toda consolação carnal, que me aparta do amor das coisas eternas e me fascina pelo encanto de um prazer momentâneo. Não me vença, Deus meu, não me vença a carne e o sangue; não me seduza o mundo, com sua glória passageira; não me faça cair o demônio, com sua astúcia. Daí-me força para resistir, paciência para sofrer, constância para perseverar. Daí-me, em lugar de todas as consolações do mundo, a suavíssima unção do vosso espírito e, em lugar do amor terrestre, infundi-me o amor de vosso nome!

O comer, o beber, o vestir e outras coisas necessárias ao corpo são um peso para a alma fervorosa. Concedei-me usar com moderação de tais lenitivos, sem me prender a eles com demasiado afeto. Não é lícito rejeitar tudo, pois devemos sustentar a natureza; mas buscar as coisas supérfluas e o que mais delicia, proíbe-o vossa santa lei, porque de outro modo a carne se rebelará contra o espírito. Entre estes dois extremos, Senhor, peço-vos que me dirijas e governes na vossa mão, para que não pratique algum excesso.


Imitação de Cristo, Tomás de Kempis

segunda-feira, 22 de dezembro de 2014

O sono de Jesus-Menino - Por Santo Afonso Maria de Ligório




Ego dormio, et cor meum vigilat — “Eu durmo, e o meu coração vela” (Cant. 5, 2).


Sumário. O sono do Menino Jesus era muito diferente do das outras crianças. Enquanto dormia, seu Corpo, a Alma, unida à Pessoa do Verbo, velava. Desde então pensava nas penas que devia depois sofrer por nosso amor. Roguemos ao Santo Menino, pelo merecimento daquele bendito sono, que nos livre do sono mortal dos pecadores e, em vez disso, nos conceda o sono dos justos, pelo qual a alma perde a lembrança de todas as coisas terrestres.


I. O sono de Jesus-Menino foi demasiadamente breve e doloroso. Servia-Lhe de berço uma manjedoura, a palha de colchão e de travesseiro. Assim o sono de Jesus foi muitas vezes interrompido pela dureza daquela caminha excessivamente dura e molesta, e pelo rigor do frio que reinava na gruta. De vez em quando, porém, a natureza sucumbia à necessidade e o Menino querido adormecia. Mas o sono de Jesus foi muito diferente do das outras crianças. O sono destas é útil à conservação da vida; não, porém, quanto às operações da alma, porque esta, privada do uso dos sentidos, fica reduzida à inatividade. Não foi assim o sono de Jesus Cristo: Ego dormio et cor meum vigilat. O Corpo repousava; velava, porém, a alma, que em Jesus era unida à Pessoa do Verbo, que não podia dormir nem ficar sopitada pela inatividade dos sentidos.


Dormia, pois, o santo Menino, mas enquanto dormia, pensava em todos os padecimentos que teria de sofrer por nosso amor, no correr de toda a sua vida e na hora da sua morte. Pensava nos trabalhos pelos quais havia de passar no Egito e em Nazaré, levando uma vida extremamente pobre e desprezada. Pensava particularmente nos açoites, nos espinhos, nas injúrias, na agonia e na morte desolada, que afinal devia padecer sobre a Cruz. Tudo isso Jesus oferecia ao Pai Eterno enquanto estava dormindo, a fim de obter para nós o perdão e a salvação. Assim nosso Salvador, durante o sono, estava merecendo por nós, reconciliava conosco seu Pai e alcançava-nos graças.


Roguemos agora a Jesus que, pelos merecimentos de seu beato sono, nos livre do sono mortal dos pecadores, que dormem miseravelmente na morte do pecado, esquecidos de Deus e do seu amor. Peçamos-Lhe que nos dê, ao contrário, o sono feliz da sagrada Esposa, da qual dizia: Eu vos conjuro… que não perturbeis à minha amada o seu descanso, nem a façais despertar, até que ela mesma queira (1). É este o sono que Deus dá às almas suas diletas, e que, no dizer de São Basílio, não é senão o supremo olvido de todas as coisas — summa verum omnium oblivio. Então a alma olvida todas as coisas terrestres, para só pensar em Deus e nos interesses da glória divina.


II. Ó meu querido e santo Menino, Vós estais dormindo, mas esse vosso sono como me abrasa em amor! Para nós o sono é figura da morte; mas em Vós é símbolo de vida eterna, porque, enquanto repousais, estais merecendo para mim a eterna salvação. Estais dormindo, porém o vosso coração não dorme, senão pensa em padecer e morrer por mim. Durante o vosso sono rogais por mim e me impetrais de Deus o descanso eterno do Paraíso. Mas enquanto não me levardes, como espero, para repousar junto de Vós no Céu, quero que repouseis sempre em minha alma.


Houve um tempo, ó meu Deus, em que Vos expulsei da minha alma. Vós, porém, tanto batestes à porta do meu coração, ora por meio do temor, ora com luzes especiais, ora com convites amorosos, que tenho a esperança de que já entrastes nele. Assim espero, digo, porque sinto em mim uma grande confiança de que já me perdoastes. Sinto também uma grande aversão e arrependimento das ofensas que Vos tenho feito; um arrependimento que me causa grande dor, mas uma dor pacífica, uma dor que me consola e me faz esperar que a vossa bondade já me perdoou. Graças Vos dou, ó meu Jesus, e peço-Vos que não Vos aparteis mais da minha alma. Sei que Vós não Vos apartareis enquanto eu não Vos repulsar. É esta exatamente a graça que Vos peço e que, com vosso auxílio, espero pedir-Vos sempre: não permitais que torne a expulsar-Vos de meu coração. Fazei que eu me esqueça de todas as coisas, a fim de só pensar em Vós, que sempre pensastes em mim e na minha salvação. Fazei que Vos ame sempre nesta vida, a fim de que a minha alma, expirando unida conVosco e em vossos braços, possa repousar eternamente em Vós sem receio de jamais Vos perder. — Ó Maria, assisti-me na minha vida, assisti-me na hora da minha morte, para que Jesus sempre repouse em mim, e eu repouse sempre em Jesus. (II 370.)


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1. Cant. 2, 7.


(LIGÓRIO, Afonso Maria de. Meditações: Para todos os Dias e Festas do Ano: Tomo I: Desde o Primeiro Domingo do Advento até a Semana Santa inclusive. Friburgo: Herder & Cia, 1921, p. 119 - 122)



Advento significa expectativa - Beato Álvaro del Portillo




Advento significa expectativa e quanto mais se avizinha o acontecimento esperado, maior é o desejo por vê-lo realizado. Nós, juntamente com tantos outros cristãos, desejamos que Deus ponha ponto final à dura prova que aflige a Igreja, já há muitos anos. Desejamos que este longo advento chegue finalmente ao seu termo: que as almas se movam para a verdadeira contrição; que o Senhor se faça presente mais intensamente nos membros da sua amada Esposa, a Igreja Santa.

Desejamo-lo e pedimo-lo com toda a alma: magis quam custodes auroram, mais do que a sentinela deseja a aurora, ansiamos que a noite se transforme em pleno dia.

Caminhar com Jesus ao ritmo do ano litúrgico

Fonte: Senza Pagare

sábado, 20 de dezembro de 2014

Imitação de Cristo III - Cap. 25 - Em que consiste a firme paz do coração e o verdadeiro aproveitamento




JESUS: Filho, eu disse a meus discípulos: Eu vos deixo a paz; dou-vos a minha paz; não vo-la dou como a dá o mundo (Jo 14,27). Todos desejam a paz, mas nem todos buscam as coisas que produzem a verdadeira paz. A minha paz está com os humildes e mansos de coração. Na muita paciência encontrarás a tua paz. Se me ouvires e seguires a minha voz, poderás gozar grande paz.

A ALMA: Que hei de fazer, pois, Senhor?

JESUS: Em tudo olha bem o que fazes e dizes, e dirige toda a tua intenção só para meu agrado, sem desejar ou buscar coisa alguma fora de mim. Não julgues temerariamente das palavras e obras dos outros, nem te intrometas em coisas que não te dizem respeito; deste modo poderá ser que pouco ou raras vezes te perturbes. Nunca sentir, porém, inquietação, nem sofrer moléstia alguma do corpo ou do espírito, não é próprio da vida presente, senão do estado do eterno descanso. Não julgues, pois, ter achado a verdadeira paz, se não sentires nenhuma aflição; nem que tudo está bem, se não tiveres nenhum adversário, ou tudo perfeito, se tudo correr a teu gosto. Nem penses que és grande coisa ou singularmente amado por Deus, se sentes muita devoção e doçura, porque não são estes os sinais pelos quais se conhece o verdadeiro amante da virtude, nem consiste nisso o aproveitamento e a perfeição do homem.

A ALMA: Em que consiste, pois, Senhor?

JESUS: Em te ofereceres de todo o teu coração à divina vontade, sem buscares o teu próprio interesse em coisa alguma, nem eterna; de sorte que com igualdade de ânimo dês graças a Deus na ventura e na desgraça, pesando tudo na mesma balança. Se fores tão forte e constante na esperança que, privado de toda consolação interior, disponhas teu coração para maiores provações, sem te justificares, como se não deveras sofrer tanto, e antes louvares a santidade e a justiça em todas as minhas disposições, então andarás no verdadeiro e reto caminho da paz e poderás ter certíssima esperança de contemplar novamente minha face com júbilo. E, se chegares ao perfeito desprezo de ti mesmo, fica sabendo que então gozarás da abundância da paz, no grau possível nesta peregrinação terrestre.



Imitação de Cristo, Tomás de Kempis

Imitação de Cristo III - Cap 24 - Como se deve evitar a curiosa inquirição da vida alheia





JESUS: Filho, não sejais curioso, nem te preocupes com cuidados inúteis. Que tens tu com isto ou aquilo? Segue-me. Pois que te importa saber se fulano é assim ou assim ou se sicrano procede e fala deste ou daquele modo? Tu não és responsável pelos outros, mas de ti mesmo deves dar conta; por que, pois, te intrometes naquilo? Eu conheço a todos e vejo tudo que se faz debaixo do sol; sei como cada um procede, o que pensa e quer, e a que fim tende sua intenção. Deixa, pois, tudo ao meu cuidado, conserva-te em santa paz e deixa o inquieto agitar-se quando quiser. Sobre ele recairá tudo o que fizer ou disser, porque não me pode enganar.

Não te preocupes da sombra dum grande nome, nem da familiaridade de muitos, nem de amizade particular dos homens. Pois tudo isso gera distrações e grande perplexidade ao coração. Eu não duvidaria falar-te e descobrir-te os meus segredos, se atento esperasses minha chegada e me abrisses a porta de teu coração. Sê cauteloso, vigia na oração, e humilha-te em todas as coisas.


Imitação de Cristo, Tomás de Kempis

segunda-feira, 15 de dezembro de 2014

Santo Afonso Maria de Ligório - o Vício da Ira - Segundo ponto: Como devemos aplacar a ira nas ocasiões de provocação



Segundo Ponto

Como devemos aplacar a ira nas ocasiões de provocação

Em primeiro lugar, é necessário saber que não é possível para a fraqueza humana, em meio a tantas ocasiões, estar totalmente livre de todo o movimento de ira. Ninguém, como diz Sêneca, pode estar totalmente isento dessa paixão. "Iracundia nullum genus hominum excipit". Todos os nossos esforços devem estar direcionados para a moderação dos sentimentos de ira que brotam na alma. Como eles devem ser moderados? Pela mansidão. Essa é chamada a virtude do Cordeiro - isto é, a amada virtude de Jesus Cristo. Porque, como um cordeiro sem ira e nem mesmo queixa, Ele suportou as dores de Sua Paixão e Crucificação. "Tal como cordeiro, ele foi levado para o matadouro; como ovelha muda diante do tosquiador, ele não abriu a boca." – Isaías 53:7. Por isso Ele nos ensinou a aprender com Sua mansidão e humildade de coração. "Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração." - Mateus 11:29.

Oh! quão agradáveis os mansos são aos olhos de Deus, aqueles que se submetem pacificamente a todas as cruzes, infortúnios, perseguições e injúrias! Aos humildes é prometido o Reino dos Céus. "Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra." - Mateus 5:4. Eles são chamados filhos de Deus. "Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus." - Mateus 5:9. Alguns se gloriam de sua mansidão, mas sem qualquer fundamento, pois eles são mansos apenas com aqueles que os elogiam e lhes favorecem, mas, para os que ferem ou censuram, eles se enchem de fúria e vingança. A virtude de mansidão consiste em ser manso e pacífico com aqueles que nos odeiam e maltratam. "Com os que odiavam a paz eu era pacífico." - Salmo 119:7.

Precisamos, como diz São Paulo, revestir-nos de entranhada misericórdia para com todos os homens, e suportar-nos uns aos outros."Portanto, como eleitos de Deus, santos e queridos, revesti-vos de entranhada misericórdia, de bondade, humildade, doçura, paciência. Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, toda vez que tiverdes queixa contra outrem." - Colossenses 3:12-13. Você quer que outros suportem seus defeitos e perdoem suas falhas, então você deve agir da mesma maneira em relação aos outros. Assim, sempre que você receber um insulto de uma pessoa enfurecida contra você, lembre-se que "Uma resposta branda aplaca o furor, uma palavra dura excita a cólera."Provérbios 15:1. Um monge certa vez passou por um campo de milho, o proprietário do campo não gostou e falou-lhe em linguagem muito ofensiva e injuriosa. O monge humildemente respondeu: Irmão, você está certo, eu agi de maneira errada, me perdoe. Com esta resposta o lavrador ficou tão acalmado, que instantaneamente perdeu toda a raiva, e até quis seguir o monge e entrar na vida religiosa. O orgulhoso faz uso das humilhações que recebem para aumentar o seu orgulho, mas os humildes e os mansos transformam os desprezos e insultos oferecidos a eles em ocasião de avançar na humildade. São Bernardo diz: "É humilde aquele que converte a humilhação em humildade".

São João Crisóstomo diz que "um homem de mansidão é útil para si e para os outros". Os mansos são úteis para si mesmos, porque, de acordo com o Pe. Alvarez, o tempo de humilhação e desprezo é para eles o tempo de mérito. Assim, Jesus Cristo chama os seus discípulos de felizes por que serão injuriados e perseguidos. "Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem e perseguirem." - Mateus 5:11. Por isso, os santos sempre desejaram ser desprezados, como Jesus Cristo foi desprezado. Os mansos são úteis para os outros, porque, como o mesmo São João Crisóstomo diz, não há nada melhor calculado para atrair outros para Deus, do que ver um cristão manso e alegre quando recebe um ferimento ou um insulto. "Nihil ita conciliat Domino familiares ut quod illum vident mansuetudine jucundum". A razão disso é que a virtude se torna conhecida ao ser testada e, como o ouro é provado no fogo, a mansidão dos homens é provada na humilhação. "Porque o ouro é provado no fogo e as pessoas escolhidas no forno da humilhação." - Eclesiástico 2:5. "O meu nardo", diz a esposa no Cântico, "exala o seu perfume." - Cânticos 1:11. O nardo é uma planta aromática, mas só difunde seus odores quando é rasgada ou ferida. Nesta passagem, o escritor inspirado nos dá a entender, que um homem não pode ser chamado de manso, a menos que seja conhecido por exalar o perfume de sua mansidão suportando injúrias e insultos em paz e sem raiva. Deus quer que sejamos mansos, até em relação a nós mesmos. Quando uma pessoa comete uma falha, Deus certamente deseja que ela se humilhe, se arrependa de seus pecados, com o propósito de nunca cair neles novamente, mas Ele não quer que ela fique indignada consigo mesma, dando lugar a problemas e agitações na consciência, pois, quando a alma está agitada, o homem é incapaz de fazer o bem. "O meu coração está conturbado, a minha força me desamparou." - Salmo 37:11.

Assim, quando recebemos um insulto, devemos fazer violência a nós mesmos, a fim de aplacar a ira. Respondamos com mansidão, como recomendado acima, ou fiquemos em silêncio, e assim venceremos, como diz Santo Isidoro. "Quamvis quis irritet, tu dissimula, quia tacendo vinces". Mas, se você responder com a paixão, você fará mal a si e aos outros. Seria ainda pior dar uma resposta com ira a uma pessoa que o corrige. Pois São Bernardo diz: "Medicanti irascitur qui non irascitur sagittanti". Alguns não ficam com raiva, mas deveriam estar indignados com aqueles que ferem suas almas pela lisonja, e ficam cheios de indignação contra a pessoa que o censura para curar as suas irregularidades. Contra o homem que detesta a correção, a sentença de perdição, de acordo com o Homem Sábio, já foi pronunciada. "Porque odiaram as instruções e não abraçaram o temor do Senhor, nem se submeteram ao meu conselho, mas desprezaram todas as minhas repreensões, comerão, pois, o fruto do seu próprio proceder e fartar-se-ão dos seus conselhos. A indocilidade dos fátuos os matará e a (falsa) prosperidade dos insensatos os destruirá." - Provérbios 1:29-32. Os insensatos contam como prosperidade estarem livres de correção, ou desprezar as advertências que recebem, mas tal prosperidade é a causa de sua ruína. Quando você se deparar com uma ocasião de ira, você deve, em primeiro lugar, estar em guarda para não permitir que a ira entre em seu coração. "Não seja fácil em te irares." - Eclesiastes 7:10. Algumas pessoas mudam de cor, e caem em uma paixão a cada contradição, e quando a raiva foi admitida, Deus sabe a que ela deve levá-los. Por isso, é necessário prever essas ocasiões em nossas meditações e orações, pois, a menos que estejamos preparados para elas, será tão difícil aplacar a ira quanto pôr um freio em um cavalo enquanto ele está fugindo.

Sempre que tivermos a infelicidade de permitir que a ira entre na alma, sejamos cuidadosos para não permitir que ela permaneça. Jesus Cristo diz a todos para se lembrarem de que se um irmão estiver ofendido com você, não se deve oferecer os dons no altar, sem primeiro se reconciliar com o próximo. “Vai reconciliar-te primeiro com teu irmão, depois vem fazer a tua oferta.” - Mateus 5:24. E aquele que tenha recebido qualquer ofensa, deve se esforçar para extirpar do seu coração não só toda a raiva, mas também todo sentimento de amargura para com as pessoas que o ofenderam. "Toda a amargura, animosidade, cólera, clamor, maledicência, com toda espécie de malícia seja banida de entre vós." - Efésios 4:31. Enquanto a ira persistir, siga o conselho de Sêneca - "Quando você estiver com raiva, não faça nada, não diga nada que possa ser instigado pela raiva". Como Davi, fique em silêncio, e não fale quando você sentir que está perturbado. "Fiquei perturbado e não falei." - Salmo 76:5. Quantos, quando estão inflamados pela ira, dizem e fazem aquilo de que eles mais tarde, em seus momentos mais calmos, se arrependem e se desculpam dizendo que estavam transtornados pela paixão? Enquanto a ira persistir, devemos ficar em silêncio, e abster-nos de fazer ou resolver fazer qualquer coisa, pois, o que é feito no calor da paixão será, de acordo com a máxima de São Tiago, injusto. "Porque a ira do homem não produz a justiça de Deus." – Tiago 1: 20. Também é necessário se abster completamente de consultar aqueles que poderiam fomentar a nossa indignação. Davi diz: "Ditoso o homem que não se deixou levar pelo conselho dos ímpios." – Salmo 1:1. Para aquele a quem se pede conselho, o Eclesiástico diz: "Se assoprares a uma faísca, ela se inflamará, se cuspires sobre ela, se apagará: e uma e outra coisa saem da boca." – Eclesiástico 28:14. Quando uma pessoa está indignada por causa de alguma injúria que recebeu, você deve apagar esse fogo, exortando-o à paciência, mas, se você incentivar a vingança, você poderá acender uma grande chama. Que aquele que se sente de alguma forma inflamado pela raiva, ponha-se em guarda contra os falsos amigos, que, por uma palavra imprudente, podem ser a causa de sua perdição.

Sigamos o conselho do apóstolo: "Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem." - Romanos 12:21. Não te deixes vencer pelo mal: não se permita ser conquistado pelo pecado. Se, pela ira, você buscar vingança ou proferir blasfêmias, você será vencido pelo pecado. Mas você dirá: eu tenho, naturalmente, um temperamento forte. Pela graça de Deus e fazendo violência a si mesmo, você será capaz de vencer essa disposição natural. Não consinta com a ira, e você dominará o calor do seu temperamento. Mas você dirá: eu não posso suportar o tratamento injusto. Em resposta eu lhe direi, em primeiro lugar, lembre-se que a ira obscurece a razão e nos impede de ver as coisas como elas são. "Caiu fogo de cima sobre eles, e não viram mais o sol." - Salmo 57:9. Em segundo lugar, se você pagar o mal com o mal, o se inimigo terá uma vitória sobre você. Davi disse: "Se paguei com mal aos que mo faziam, caia eu com razão debaixo dos meus inimigos, sem esperança." - Salmo 7:5. Se eu pagar o mal com o mal, serei derrotado pelos meus inimigos. "Supere o mal com o bem". Dê a todos os inimigos o bem em troca do mal. Jesus Cristo diz: “Fazei bem aos que vos odeiam.” - Mateus 5:44. Esta é a vingança dos santos e é chamada por São Paulino de vingança celestial. É por meio dessa vingança que você deve conquistar a vitória. E se algum desses, de quem o profeta diz: "O veneno de víbora está nos seus lábios."– Salmo 139: 4, perguntar a você como pode se submeter a tal injúria, responda: "Não hei de beber o cálice que meu Pai me deu?" - João 18:11. E, em seguida, voltando-se a Deus, você dirá: "Emudeci e não abri a minha boca, porque Tu o fizeste.” - Salmo 38:10, pois é certo que cada cruz que recai sobre você, vem do Senhor. "Os bens e os males, a vida e a morte, a pobreza e a riqueza, tudo isto vem de Deus." - Eclesiástico 11:14. Se alguém lhe tirar a sua propriedade, recupere-a se for possível, mas, se não for, diga com Jó: "O Senhor o deu, o Senhor o tirou." - Jó 1:21. Certo filósofo, que perdeu alguns de Segundo Ponto
Como devemos aplacar a ira nas ocasiões de provocação

Em primeiro lugar, é necessário saber que não é possível para a fraqueza humana, em meio a tantas ocasiões, estar totalmente livre de todo o movimento de ira. Ninguém, como diz Sêneca, pode estar totalmente isento dessa paixão. "Iracundia nullum genus hominum excipit". Todos os nossos esforços devem estar direcionados para a moderação dos sentimentos de ira que brotam na alma. Como eles devem ser moderados? Pela mansidão. Essa é chamada a virtude do Cordeiro - isto é, a amada virtude de Jesus Cristo. Porque, como um cordeiro sem ira e nem mesmo queixa, Ele suportou as dores de Sua Paixão e Crucificação. "Tal como cordeiro, ele foi levado para o matadouro; como ovelha muda diante do tosquiador, ele não abriu a boca." – Isaías 53:7. Por isso Ele nos ensinou a aprender com Sua mansidão e humildade de coração. "Aprendei de mim, porque sou manso e humilde de coração." - Mateus 11:29.

Oh! quão agradáveis os mansos são aos olhos de Deus, aqueles que se submetem pacificamente a todas as cruzes, infortúnios, perseguições e injúrias! Aos humildes é prometido o Reino dos Céus. "Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra." - Mateus 5:4. Eles são chamados filhos de Deus. "Bem-aventurados os pacíficos, porque serão chamados filhos de Deus." - Mateus 5:9. Alguns se gloriam de sua mansidão, mas sem qualquer fundamento, pois eles são mansos apenas com aqueles que os elogiam e lhes favorecem, mas, para os que ferem ou censuram, eles se enchem de fúria e vingança. A virtude de mansidão consiste em ser manso e pacífico com aqueles que nos odeiam e maltratam. "Com os que odiavam a paz eu era pacífico." - Salmo 119:7.

Precisamos, como diz São Paulo, revestir-nos de entranhada misericórdia para com todos os homens, e suportar-nos uns aos outros. "Portanto, como eleitos de Deus, santos e queridos, revesti-vos de entranhada misericórdia, de bondade, humildade, doçura, paciência. Suportai-vos uns aos outros e perdoai-vos mutuamente, toda vez que tiverdes queixa contra outrem." - Colossenses 3:12-13. Você quer que outros suportem seus defeitos e perdoem suas falhas, então você deve agir da mesma maneira em relação aos outros. Assim, sempre que você receber um insulto de uma pessoa enfurecida contra você, lembre-se que "Uma resposta branda aplaca o furor, uma palavra dura excita a cólera." Provérbios 15:1. Um monge certa vez passou por um campo de milho, o proprietário do campo não gostou e falou-lhe em linguagem muito ofensiva e injuriosa. O monge humildemente respondeu: Irmão, você está certo, eu agi de maneira errada, me perdoe. Com esta resposta o lavrador ficou tão acalmado, que instantaneamente perdeu toda a raiva, e até quis seguir o monge e entrar na vida religiosa. O orgulhoso faz uso das humilhações que recebem para aumentar o seu orgulho, mas os humildes e os mansos transformam os desprezos e insultos oferecidos a eles em ocasião de avançar na humildade. São Bernardo diz: "É humilde aquele que converte a humilhação em humildade".

São João Crisóstomo diz que "um homem de mansidão é útil para si e para os outros". Os mansos são úteis para si mesmos, porque, de acordo com o Pe. Alvarez, o tempo de humilhação e desprezo é para eles o tempo de mérito. Assim, Jesus Cristo chama os seus discípulos de felizes por que serão injuriados e perseguidos. "Bem-aventurados sereis quando vos caluniarem e perseguirem." - Mateus 5:11. Por isso, os santos sempre desejaram ser desprezados, como Jesus Cristo foi desprezado. Os mansos são úteis para os outros, porque, como o mesmo São João Crisóstomo diz, não há nada melhor calculado para atrair outros para Deus, do que ver um cristão manso e alegre quando recebe um ferimento ou um insulto. "Nihil ita conciliat Domino familiares ut quod illum vident mansuetudine jucundum". A razão disso é que a virtude se torna conhecida ao ser testada e, como o ouro é provado no fogo, a mansidão dos homens é provada na humilhação. "Porque o ouro é provado no fogo e as pessoas escolhidas no forno da humilhação." - Eclesiástico 2:5. "O meu nardo", diz a esposa no Cântico, "exala o seu perfume." - Cânticos 1:11. O nardo é uma planta aromática, mas só difunde seus odores quando é rasgada ou ferida. Nesta passagem, o escritor inspirado nos dá a entender, que um homem não pode ser chamado de manso, a menos que seja conhecido por exalar o perfume de sua mansidão suportando injúrias e insultos em paz e sem raiva. Deus quer que sejamos mansos, até em relação a nós mesmos. Quando uma pessoa comete uma falha, Deus certamente deseja que ela se humilhe, se arrependa de seus pecados, com o propósito de nunca cair neles novamente, mas Ele não quer que ela fique indignada consigo mesma, dando lugar a problemas e agitações na consciência, pois, quando a alma está agitada, o homem é incapaz de fazer o bem. "O meu coração está conturbado, a minha força me desamparou." - Salmo 37:11.

Assim, quando recebemos um insulto, devemos fazer violência a nós mesmos, a fim de aplacar a ira. Respondamos com mansidão, como recomendado acima, ou fiquemos em silêncio, e assim venceremos, como diz Santo Isidoro. "Quamvis quis irritet, tu dissimula, quia tacendo vinces". Mas, se você responder com a paixão, você fará mal a si e aos outros. Seria ainda pior dar uma resposta com ira a uma pessoa que o corrige. Pois São Bernardo diz: "Medicanti irascitur qui non irascitur sagittanti". Alguns não ficam com raiva, mas deveriam estar indignados com aqueles que ferem suas almas pela lisonja, e ficam cheios de indignação contra a pessoa que o censura para curar as suas irregularidades. Contra o homem que detesta a correção, a sentença de perdição, de acordo com o Homem Sábio, já foi pronunciada. "Porque odiaram as instruções e não abraçaram o temor do Senhor, nem se submeteram ao meu conselho, mas desprezaram todas as minhas repreensões, comerão, pois, o fruto do seu próprio proceder e fartar-se-ão dos seus conselhos. A indocilidade dos fátuos os matará e a (falsa) prosperidade dos insensatos os destruirá." - Provérbios 1:29-32. Os insensatos contam como prosperidade estarem livres de correção, ou desprezar as advertências que recebem, mas tal prosperidade é a causa de sua ruína. Quando você se deparar com uma ocasião de ira, você deve, em primeiro lugar, estar em guarda para não permitir que a ira entre em seu coração. "Não seja fácil em te irares." - Eclesiastes 7:10. Algumas pessoas mudam de cor, e caem em uma paixão a cada contradição, e quando a raiva foi admitida, Deus sabe a que ela deve levá-los. Por isso, é necessário prever essas ocasiões em nossas meditações e orações, pois, a menos que estejamos preparados para elas, será tão difícil aplacar a ira quanto pôr um freio em um cavalo enquanto ele está fugindo.

Sempre que tivermos a infelicidade de permitir que a ira entre na alma, sejamos cuidadosos para não permitir que ela permaneça. Jesus Cristo diz a todos para se lembrarem de que se um irmão estiver ofendido com você, não se deve oferecer os dons no altar, sem primeiro se reconciliar com o próximo. “Vai reconciliar-te primeiro com teu irmão, depois vem fazer a tua oferta.” - Mateus 5:24. E aquele que tenha recebido qualquer ofensa, deve se esforçar para extirpar do seu coração não só toda a raiva, mas também todo sentimento de amargura para com as pessoas que o ofenderam. "Toda a amargura, animosidade, cólera, clamor, maledicência, com toda espécie de malícia seja banida de entre vós." - Efésios 4:31. Enquanto a ira persistir, siga o conselho de Sêneca - "Quando você estiver com raiva, não faça nada, não diga nada que possa ser instigado pela raiva". Como Davi, fique em silêncio, e não fale quando você sentir que está perturbado. "Fiquei perturbado e não falei." - Salmo 76:5. Quantos, quando estão inflamados pela ira, dizem e fazem aquilo de que eles mais tarde, em seus momentos mais calmos, se arrependem e se desculpam dizendo que estavam transtornados pela paixão? Enquanto a ira persistir, devemos ficar em silêncio, e abster-nos de fazer ou resolver fazer qualquer coisa, pois, o que é feito no calor da paixão será, de acordo com a máxima de São Tiago, injusto. "Porque a ira do homem não produz a justiça de Deus." – Tiago 1: 20. Também é necessário se abster completamente de consultar aqueles que poderiam fomentar a nossa indignação. Davi diz: "Ditoso o homem que não se deixou levar pelo conselho dos ímpios." – Salmo 1:1. Para aquele a quem se pede conselho, o Eclesiástico diz: "Se assoprares a uma faísca, ela se inflamará, se cuspires sobre ela, se apagará: e uma e outra coisa saem da boca." – Eclesiástico 28:14. Quando uma pessoa está indignada por causa de alguma injúria que recebeu, você deve apagar esse fogo, exortando-o à paciência, mas, se você incentivar a vingança, você poderá acender uma grande chama. Que aquele que se sente de alguma forma inflamado pela raiva, ponha-se em guarda contra os falsos amigos, que, por uma palavra imprudente, podem ser a causa de sua perdição.

Sigamos o conselho do apóstolo: "Não te deixes vencer pelo mal, mas vence o mal com o bem." - Romanos 12:21. Não te deixes vencer pelo mal: não se permita ser conquistado pelo pecado. Se, pela ira, você buscar vingança ou proferir blasfêmias, você será vencido pelo pecado. Mas você dirá: eu tenho, naturalmente, um temperamento forte. Pela graça de Deus e fazendo violência a si mesmo, você será capaz de vencer essa disposição natural. Não consinta com a ira, e você dominará o calor do seu temperamento. Mas você dirá: eu não posso suportar o tratamento injusto. Em resposta eu lhe direi, em primeiro lugar, lembre-se que a ira obscurece a razão e nos impede de ver as coisas como elas são. "Caiu fogo de cima sobre eles, e não viram mais o sol." - Salmo 57:9. Em segundo lugar, se você pagar o mal com o mal, o se inimigo terá uma vitória sobre você. Davi disse: "Se paguei com mal aos que mo faziam, caia eu com razão debaixo dos meus inimigos, sem esperança." - Salmo 7:5. Se eu pagar o mal com o mal, serei derrotado pelos meus inimigos. "Supere o mal com o bem". Dê a todos os inimigos o bem em troca do mal. Jesus Cristo diz: “Fazei bem aos que vos odeiam.” - Mateus 5:44. Esta é a vingança dos santos e é chamada por São Paulino de vingança celestial. É por meio dessa vingança que você deve conquistar a vitória. E se algum desses, de quem o profeta diz: "O veneno de víbora está nos seus lábios." – Salmo 139: 4, perguntar a você como pode se submeter a tal injúria, responda: "Não hei de beber o cálice que meu Pai me deu?" - João 18:11. E, em seguida, voltando-se a Deus, você dirá: "Emudeci e não abri a minha boca, porque Tu o fizeste.” - Salmo 38:10, pois é certo que cada cruz que recai sobre você, vem do Senhor. "Os bens e os males, a vida e a morte, a pobreza e a riqueza, tudo isto vem de Deus." - Eclesiástico 11:14. Se alguém lhe tirar a sua propriedade, recupere-a se for possível, mas, se não for, diga com Jó: "O Senhor o deu, o Senhor o tirou." - Jó 1:21. Certo filósofo, que perdeu alguns de seus bens em uma tempestade, disse: "Perdi os meus bens, mas não perderei a minha paz". E você dirá: Perdi a minha propriedade, mas não vou perder minha alma.

Em suma, quando nos encontrarmos com cruzes, perseguições e injúrias, voltemo-nos para Deus, que nos ordena suportá-las com paciência, e assim sempre evitaremos a ira. "Lembra-te do temor de Deus, e não te ires contra o teu próximo." - Eclesiástico 28:8. Demos uma olhada na vontade de Deus, que dispõe todas as coisas desta maneira para o nosso mérito, e assim a ira cessará. Demos uma olhada em Jesus crucificado, e não teremos coragem de reclamar. Santo Eleazar, ao ser perguntado por sua esposa, como suportava tantas injúrias, sem ceder à ira, respondeu: eu me viro para Jesus Cristo e assim preservo a minha paz. Finalmente, demos uma olhada em nossos pecados, para os quais merecemos muito mais desprezos e castigos, e nós calmamente nos submeteremos a todos os males. Santo Agostinho diz que, embora às vezes sejamos inocentes de um crime pelo qual somos perseguidos, nós somos, no entanto, culpados de outros pecados que merecem castigo maior do que aquele que estamos sofrendo. "Esto non habemus peccatum, quod objicitur; habemus tamen, quod digne in nobis flagelletur".us bens em uma tempestade, disse: "Perdi os meus bens, mas não perderei a minha paz". E você dirá: Perdi a minha propriedade, mas não vou perder minha alma.

Em suma, quando nos encontrarmos com cruzes, perseguições e injúrias, voltemo-nos para Deus, que nos ordena suportá-las com paciência, e assim sempre evitaremos a ira. "Lembra-te do temor de Deus, e não te ires contra o teu próximo." - Eclesiástico 28:8. Demos uma olhada na vontade de Deus, que dispõe todas as coisas desta maneira para o nosso mérito, e assim a ira cessará. Demos uma olhada em Jesus crucificado, e não teremos coragem de reclamar. Santo Eleazar, ao ser perguntado por sua esposa, como suportava tantas injúrias, sem ceder à ira, respondeu: eu me viro para Jesus Cristo e assim preservo a minha paz. Finalmente, demos uma olhada em nossos pecados, para os quais merecemos muito mais desprezos e castigos, e nós calmamente nos submeteremos a todos os males. Santo Agostinho diz que, embora às vezes sejamos inocentes de um crime pelo qual somos perseguidos, nós somos, no entanto, culpados de outros pecados que merecem castigo maior do que aquele que estamos sofrendo. "Esto non habemus peccatum, quod objicitur; habemus tamen, quod digne in nobis flagelletur".


Fonte: Blog Alma Devota

sexta-feira, 5 de dezembro de 2014

Santo Afonso Maria de Ligório - O Vício da Ira - Primeiro Ponto

 

                                         A ruína que a ira desenfreada traz para a alma


São Jerônimo diz que a ira é a porta pela qual todos os vícios entram na alma. "Omnium vitiorum janua est iracundia”. A ira precipita os homens em ressentimentos, blasfêmias, atos de injustiça, detrações, escândalos e outras iniquidades, pois a paixão da ira escurece o entendimento e faz o homem agir como uma besta e um louco. "Caligavit ab indignatione oculus meus" – Jó 17:7. Meu olho perdeu a visão, por causa da indignação. Davi disse: "Meu olho está atribulado pela ira." - Salmo 30:10. Por isso, segundo São Boaventura, um homem irritado é incapaz de distinguir entre o que é justo e injusto. "Iratus non potest videre quod justum est, vel injustum". Em uma palavra, São Jerônimo diz que a ira priva o homem da prudência, da razão e do entendimento. "Ab omni consilio deturpat, ut donee irascitur, insanire credatur". Assim, São Tiago diz: "Porque a ira do homem não produz a justiça de Deus." - Tiago 1:20. Os atos de um homem sob a influência da ira não podem estar de acordo com a justiça divina e, consequentemente, não podem ser irrepreensíveis.

Um homem que não refreia o impulso da ira cai facilmente em ódio contra a pessoa que tenha sido ocasião de sua paixão. Segundo Santo Agostinho, o ódio nada mais é que uma raiva perseverante. "Odium est ira diuturno tempore perseverans". Por isso, Santo Tomás diz que "a ira é súbita, mas o ódio é duradouro". Parece, então, que naquele em quem persevera a ira, o ódio também reina. Mas alguns dirão: Eu sou o chefe da casa, devo corrigir os meus filhos e servos, e, quando necessário, tenho que levantar a voz contra os distúrbios que testemunho. Digo como resposta: Uma coisa é ter ira contra um irmão, outra coisa é ficar descontente com os pecados de um irmão. Ter ira contra o pecado não é ira, mas Zelo e, portanto, não somente é permitido, mas às vezes é um dever. Mas a nossa ira deve ser acompanhada pela Prudência, e deve ser dirigida contra o pecado, não contra o pecador, pois se a pessoa que estamos corrigindo perceber que falamos por meio da paixão e do ódio contra ele, a correção será inútil e até mesmo perversa. Portanto, ter ira contra o pecado de um irmão é certamente legítimo. Santo Agostinho diz:"Não está irado contra um irmão, aquele que está irado contra o pecado de um irmão". Assim, como disse Davi, podemos estar irados sem pecar."Irai-vos e não queirais pecar." - Salmo 4:5. Mas, estar irado contra um irmão por causa do pecado que ele cometeu não é permitido, porque, de acordo com Santo Agostinho, não estamos autorizados a odiar os outros por causa de seus vícios. "Nec propter vitia (licet) homines odisse".

O ódio traz consigo um desejo de vingança, pois, segundo Santo Tomás, a ira, quando totalmente voluntária, é acompanhada por um desejo de vingança. “Ira est appetitus vindictoe”. Mas talvez você diga: Se eu me ressinto de tal injúria, Deus terá piedade de mim, porque eu tenho motivos justos de ressentimento. Quem, pergunto eu, lhe disse que você tem motivos justos para buscar vingança? É você, cujo entendimento está obscurecido pelas paixões, quem diz isso. Já disse que a raiva obscurece a mente e tira a razão e o entendimento.

Enquanto durar a paixão da ira, você considerará a conduta de seu próximo como muito injusta e intolerável, mas, quando a sua ira tiver passado, você verá que o ato dele não foi tão ruim como pareceu antes. Mas, apesar de a injúria ser grave, ou mesmo muito grave, Deus não terá compaixão de você, se você procurar vingança. Não, Ele diz: A vingança pelos pecados não pertence a você, mas a Mim, e quando chegar o tempo, vou castigá-los como eles merecem. "A Mim pertence a vingança e eu lhes darei a paga a seu tempo." - Deuteronômio 32:35. Se você se ressente de uma injúria feita pelo próximo, Deus justamente infligirá vingança sobre você por todas as injúrias que você tiver feito a ele, e em particular por se vingar de um irmão, a quem Ele ordena que se perdoe. "Aquele que quer vingar-se encontrará a vingança do Senhor.... Um homem conserva a sua ira contra outro homem, e pede a Deus remédio?.... Aquele que, sendo apenas carne, conserva rancor e pede propiciação a Deus?, quem lhe alcançará perdão por seus pecados?” - Eclesiástico 28:1,3,5. O homem, um verme feito de carne, conserva rancor e se vinga de um irmão, e depois se atreve a pedir misericórdia de Deus? E quem, acrescenta o Sagrado Escritor, pode obter o perdão para as culpas de tão ousado pecador? Diz Santo Agostinho: "Qua fronte indulgentiam peccatorem obtinere poterit, qui praecipienti dare veniam non acquiescit". Como aquele que não obedece à ordem de Deus de perdoar o seu próximo pode esperar obter de Deus o perdão dos seus próprios pecados?

Imploremos ao Senhor que nos preserve de ceder a qualquer paixão forte e particularmente à ira. "Não me entregueis a uma alma sem vergonha e sem recato." - Eclesiástico 23:6. Porque aquele que se submete a tal paixão está exposto ao grande perigo de cair em um pecado grave contra Deus ou contra o próximo. Quantos, em consequência da não conterem a ira, cometeram blasfêmias horríveis contra Deus ou seus santos. Mas, ao mesmo tempo em que estamos em uma onda de indignação, Deus está armado com flagelos. O Senhor disse um dia ao profeta Jeremias: "Que vês tu, Jeremias? Eu respondi: Vejo uma vara vigilante." - Jeremias 1:11. Senhor, vejo uma vara vigilante a infligir punição. O Senhor lhe perguntou de novo: "Que vês tu? Respondi: Vejo uma panela a ferver." - Jeremias 1:13. A panela a ferver é a figura de um homem inflamado de ira e ameaçado com uma vara, ou seja, com a vingança de Deus. Percebam, então, a ruína que a ira desenfreada traz ao homem. Primeiro, ela o priva da graça de Deus, e depois da vida corporal."A inveja e a ira abreviam os dias." - Eclesiástico 30:26. Jó diz:"Verdadeiramente, a ira mata o insensato e a inveja mata o pequeno." - Jó 5:2. Em todos os dias da sua vida, pessoas viciadas em irar-se são infelizes, porque estão sempre em uma tempestade.
 
 
Fonte: Almas Devotas / O Segredo do Rosário

Imitação de Cristo III - Cap 23 - Das quatro coisas que produzem grande paz




1. Jesus: Filho, vou agora te ensinar o caminho da paz e da verdadeira liberdade.

2. A alma: Fazei, Senhor, o que dizeis, que muito grato me é ouvi-lo.

3. Jesus: Filho, trata de fazer antes a vontade alheia que a tua. Prefere sempre ter menos que mais. Busca sempre o último lugar e sujeita-te a todos. Deseja sempre e roga que se cumpra plenamente em ti a vontade de Deus. O homem que assim procede penetra na região da paz e do descanso.

4. A alma: Senhor, este vosso discurso é breve, mas encerra muita perfeição. Poucas são as palavras, cheias, porém, de sabedoria e de copioso fruto. Se eu as praticasse fielmente, não me deixaria perturbar com tanta facilidade. Pois, todas as vezes que me sinto inquieto e aflito, verifico que me desviei desta doutrina. Vós, porém, que tudo podeis e desejais sempre o progresso da alma, aumentai em mim a graça, para que possa guardar vossos ensinamentos e levar a efeito minha salvação.

 Oração contra os maus pensamentos

1. Senhor, meu Deus, não vos aparteis de mim, meu Deus dignai-vos socorrer-me (Sl 70,13). Pois me invadem vários pensamentos, e grandes temores afligem minha alma. Como escaparei ileso, como poderei vencê-los?

2. Diante de ti, são palavras vossas, irei eu e humilharei os soberbos da terra (Is 14,1); abrir-te-ei as portas do cárcere e te revelarei mistérios recônditos.

3. Fazei Senhor, conforme dizeis e dissipe vossa presença todos os maus pensamentos. Esta é a minha única esperança e consolação: a vós recorrer em toda tribulação, em vós confiar, invocar-vos de todo o coração e com paciência aguardar a vossa consolação. Amém.

 Oração para pedir o esclarecimento do espírito

1. Iluminai-me, ó bom Jesus, com a claridade da luz interior e dissipai todas as trevas que reinam em meu coração. Refreai as dissipações nocivas e rebatei as tentações, que me fazem violência. Pelejai valorosamente por mim, e afugentai as más feras, essas traiçoeiras concupiscências, para que se faça a paz por vossa virtude, e ressoe perene louvor no templo santo, que é a consciência pura. Mandai aos ventos e às tempestades; dizei ao mar: aplaca-te, e ao tufão: não sopres; e haverá grande bonança.

2. Enviai vossa luz e vossa verdade (Sl 42,3), para que resplandeçam sobre a terra; porque sou terra vazia e estéril, enquanto não me iluminais. Derramai sobre mim vossa graça e banhai o meu coração com o orvalho celestial; abri as fontes de devoção, que reguem a face da terra, para que produza frutos bons e perfeitos. Erguei meu espírito abatido pelo peso dos pecados e dirigi meus desejos paras as coisas do céu, para que, antegozando a doçura da suprema felicidade, me aborreça em pensar nas coisas da terra. Desprendei-me e arrancai-me de toda transitória consolação das criaturas, porque nenhuma coisa criada pode consolar-me plenamente ou satisfazer meus desejos. Uni-me convosco pelo vínculo indissolúvel do amor, porque só vós bastais a quem vos ama, e sem vós tudo o mais é vaidade. Amém.

(Tomás de Kempis - Imitação de Cristo)

Comentário do Evangelho do dia (05/12) feito por Santo Agostinho




(354-430), bispo de Hipona (norte de África), doutor da Igreja




                                                «Seja-vos feito segundo a vossa fé»

As multidões seguem Jesus e os povos crêem nele. E eis dois cegos, sentados à beira da estrada (Mt 20,29ss): eles são a imagem dos fiéis que O seguem acreditando nos mistérios da sua humanidade. Eles desejam a luz do alto, eles pedem alguns raios de luz sobre o Verbo eterno. A humanidade de Cristo é a via que conduz à salvação. É à passagem de Jesus, é pela fé na Encarnação e na Paixão do Filho de Deus, que eles se esforçam por obter o que desejam. Com efeito, Jesus passa, por assim dizer, no mistério da sua vida mortal; é a obra que Ele realiza que mede a sua passagem no tempo.

Para nos fazermos ouvir por Ele, precisamos de levantar a voz com força, de dominar o barulho e o tumulto da multidão, de orar com insistência e perseverança. Os impulsos da carne, qual multidão desordenada, assaltam a alma quando esta deseja contemplar a luz eterna, e opõem-se aos seus esforços. A influência do turbilhão da sociedade dos homens carnais perturba a meditação do espírito. É necessário um vigor espiritual muito grande para ultrapassar todos estes obstáculos.

Jesus disse: «Pois quem pede recebe e quem procura encontra, e ao que bate abrir-se-á» (Mt 7,8). Assim, quando ouve aqueles que, no ardor do seu desejo, se aproximam dele, Jesus detém-Se no caminho, toca nestes cegos que pedem luz e ilumina-os. Mistério admirável!

Jesus passa: o seu aparecimento na enfermidade da carne é momentâneo. Jesus detém-Se: a eternidade do Verbo é estável e tudo renova, permanecendo imutável em Si mesma. A fé na encarnação no tempo prepara-nos para a inteligência do mistério eterno de Deus.
 
 
Fonte: Evangelho Quotidiano

quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

O modo de receber o Santíssimo Sacramento da Eucaristia




Com diferentes finalidades podemos aproximar-nos desse sacramento. Para obtê-las, devemos dar certos passos em três momentos: antes, durante e depois da comunhão.
            Antes da comunhão, seja qual for a finalidade com que a recebes, deves purificar-te e lavar-te com o sacramento da penitência, caso tenhas cometido pecado mortal. Depois, é necessário que te entregues de todo o coração, com toda a alma, com todas as forças a Jesus Cristo, já que Ele, no sacramento, nos dá Seu Corpo e Sangue, junto com a Sua alma, divindade e méritos. Então, tendo em conta que o que oferecemos é bem pouco, devemos desejar possuir tudo o que Lhe ofereceram todas as criaturas do céu e da terra, para podermos oferecer-Lhe.
            O desejo do Senhor, de que Lhe reservemos um espaço em nosso coração, para que Ele possa unir-se a nós e ajudar-nos a vencer nossos inimigos, é tão grande que não há entendimento humano capaz de compreendê-lo. Desde a véspera, ao menos, deves começar a preparar o coração, meditando nesse desejo.
            Para poder começar a compreendê-lo, deves gravar na mente duas coisas:
            A primeira é a inefável alegria que Deus, infinitamente bom, encontra em unir-se conosco, a ponto de dizer que a nossa companhia são as suas delícias (Prov 8,31).
            A segunda  é o ódio infinito que Ele tem ao pecado, por ser impedimento e obstáculo para a união que tanto deseja ter conosco, e também porque, sendo Ele pura luz e beleza infinita, não pode deixar de odiar o pecado, que não é mais que treva e mancha intolerável nas nossas almas.
            Dessa forma, conhecendo ao menos em parte o desejo que Deus tem de se apossar do teu coração, para lançar fora os teus e Seus inimigos, anima-te também do desejo de O receber com essa mesma finalidade. E, para melhor te preparares, redobra os atos de virtude com os quais buscas vencer tuas paixões, nas horas que antecedem a Sagrada Comunhão.
            Um pouco antes de receber a comunhão, deves relembrar brevemente as tuas faltas desde a comunhão interior, e então, aproximando o teu abismo de ingratidão do abismo de bondade do Senhor, chega-te a Ele com confiança e abre-lhe a porta do teu coração, para que Ele tome posse de ti. Ao mesmo tempo, fecha resolutamente a porta a todas as coisas do mundo, a tudo o que não seja Deus.
            Depois de receberes a comunhão, encerra-te no íntimo do teu coração, adora o teu Senhor com profunda e humilde reverência, e então dialoga mentalmente com Ele da seguinte forma: “Vês, meu único Bem, com quanta facilidade Te ofendo e como essa paixão é maior do que eu, e que sozinha não consigo vencê-la. Mas esse combate é sobretudo Teu, e, embora eu tenha de lutar, só de Ti espero a vitória”.
            Oferece ao Pai eterno, em ação de graças pela vitória que esperas alcançar sobre ti mesma, o Seu próprio Filho, que Ele já te deu, e tens dentro de ti. E, enquanto lutas generosamente contra as tuas paixões, espera com fé a vitória de Deus, pois, ainda que tarde, ela não falhará, se fizerdes tudo o que estives ao teu alcance.
 
(Lorenzo Scupoli - O Combate Espiritual)

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

É uma entrega na totalidade - São Luís Maria Grignion de Montfort


                
 
                Consiste em consagrar-se inteiramente, na qualidade de escravo, a Maria e, por Ela, a Jesus Cristo. Trata-se, pois, dum compomisso a fazer todas as ações com Maria, em Maria, por meio de Maria e para Maria.
                Vou explicar o que isso significa.

                Escolherás uma data importante para essa entrega, para te consagrares e entregares em sacrifício, voluntariamente e por amor – não por constrangimento – inteiramente e sem qualquer reserva, no corpo e na alma, consagrando os teus bens exteriores de fortuna, tais como, a casa, a família e os rendimentos; e ainda os próprios bens interiores da alma, como sejam: os próprios méritos, as graças, virtudes e satisfações.
                Aqui convém sublinhar que, com esta devoção, faz-se entrega a Jesus, por meio de Maria, de tudo quanto uma alma tem de mais precioso e que nenhum Instituto Religioso pede para se sacrificar, como seja o direito da pessoa de dispor de si e do mérito das próprias orações, esmolas, mortificações e satisfações. Entrega-se inteiramente tudo; põe-se tudo à disposição da Santíssima Virgem para que o aplique segundo a sua vontade e para a maior glória de Deus que só Ela conhece com perfeição.
                Deixa-se à disposição da Santíssima Virgem odo o mérito satisfatório e impetratório das boas obras. Por isso, depois de se Lhe te feito uma al oferta, mesmo sem ser acompanhada por qualquer voto, não mais se fica dono e senhor do que quer se faça, e a Santíssima Virgem fica com o pleno direito e aplicar esse mérito que a favor duma alma do purgatório que necessite ser  aliviada ou libertada, quer em benefício dum pobre pecador a necessitar de conversão.
                Por esta devoção colocam-se as mãos da Senhora os próprios méritos. Porém, isso é para que Ela os guarde, os multiplique, e os embeleze, já que os méritos em ordem à graça santificante e à glória não poderão ser cedidos a outras pessoas.                             

                Dão-se-Lhe, no entanto, todas orações e as boas obras pessoais, uma vez que têm um valor impetratório e satisfatório, para que Ela as distribua e aplique a quem quiser.
                Se, porventura, depois duma tal consagração à Senhora, se quisesse aliviar uma alma do Purgatório, rezar pela conversão dum pecado em concreto, ajudar algum dos nossos amigos mediante a própria oração, a penitência, a esmola e ouros sacrifícios, pois poderá fazer-se desde que se Lhe peça com humildade e que, de antemão, se aceite a Sua vontade, mesmo sem a conhecer. Fique-se, porém, com a certeza de que o mérito das próprias ações – já que administrado pela mesma mão de que Deus se serve para distribuir os seus dos e graças -, só poderá ser aplicado para a maior glória de Deus.
 

O Segredo de Maria - São Luís Maria Gigion de Montfort

terça-feira, 11 de novembro de 2014

O imenso valor da Ave Maria, a saudação angélica

 


Almas predestinadas, escravas de Jesus em Maria, aprendei que a Ave-Maria é a mais bela de todas as orações, depois do Pai-Nosso. É a saudação mais perfeita que podeis fazer a Maria, pois é a saudação que o Altíssimo indicou a um arcanjo, para ganhar o coração da Virgem de Nazaré. E tão poderosas foram aquelas palavras, pelo encanto secreto que contêm, que Maria deu seu pleno consentimento para a Encarnação do Verbo, embora relutasse em sua profunda humildade. É por esta saudação que também vós ganhareis infalivelmente seu coração, contanto que a digais como deveis.


A Ave-Maria, rezada com devoção, atenção e modéstia, é, como dizem os santos, o inimigo do demônio, pondo-o logo em fuga, e o martelo que o esmaga; a santificação da alma, a alegria dos anjos, a melodia dos predestinados, o cântico do Novo Testamento, o prazer de Maria e a glória da Santíssima Trindade. A Ave-Maria é um orvalho celeste que torna a alma fecunda; é um beijo casto e amoroso que se dá em Maria, é uma rosa vermelha que se lhe apresenta, é uma pérola preciosa que se lhe oferece, é uma taça de ambrosia e de néctar divino que se lhe dá. Todas estas comparações são de santos ilustres.


Rogo-vos instantemente, pelo amor que vos consagro em Jesus e Maria, que não vos contenteis de recitar a coroinha da Santíssima Virgem, mas também o vosso terço, todos os dias, e abençoareis, na hora da morte, o dia e a hora em que me acreditastes; e, depois de ter semeado sob as bênçãos de Jesus e de Maria, colhereis bênçãos eternas no céu: "Qui seminat in benedictionibus, de benedicionibus et metet" (2 Cor 9,6).


 S. Luís Maria Grignion de Montfort, Tratado da Verdadeira Devoção à Santíssima Virgem
 
Fonte: Blog GRAA

Comentário do Evangelho do dia (07/11) feito por São Francisco Xavier




(1506-1552), missionário jesuíta
Carta de 15/01/1544


Viver gerindo bem os dons de Deus
 


Dessas regiões [Índia e Sri Lanka] só consigo escrever o seguinte: são tão grandes as consolações comunicadas por Deus nosso Senhor àqueles que vão para o meio dos pagãos para os converter à fé de Cristo que, se há alguma alegria nesta vida, é essa mesmo. Muitas vezes acontece-me ouvir a alguém que vai para o meio desses cristãos: «Senhor, não me deis tantas consolações nesta vida! Mas, uma vez que na vossa bondade e misericórdia infinitas Vós mas dais, levai-me para a vossa santa glória! Na verdade, custa tanto viver sem Vos ver, depois de Vos terdes mostrado desse modo à vossa criatura.» Ah, se aqueles que buscam o saber nos estudos se dessem ao mesmo trabalho na busca das consolações do apostolado! Se as alegrias que procura um estudante naquilo que aprende, as procurasse fazendo sentir ao seu próximo aquilo de que precisa para conhecer e servir Deus, quão mais consolado e mais bem preparado estaria para prestar contas de si próprio, quando Cristo vier e lhe pedir: «Presta-me contas da tua gestão.» […]

Termino pedindo a Deus nosso Senhor […] que nos reúna na sua santa glória. E, para obter essa benfeitoria, tomemos como intercessoras e advogadas todas as almas santas das regiões onde me encontro. […] A todas essas santas almas, peço que nos obtenham de Deus nosso Senhor que, durante o tempo que resta desta separação, nos dê a graça de sentir no fundo da alma a sua santíssima vontade e de a realizar perfeitamente.
 
 
Fonte: Evangelho Quotidiano

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Comentário do Evangelho do dia (06/11) feito por São Narsés Snorhali




(1102-1173), patriarca arménio
Jesus, Filho unigénito do Pai, §§ 26-31; SC 203

«Alegrai-vos comigo, porque encontrei a minha ovelha perdida»

Perdi-me no deserto,
Errante andei pela erma região
Como na parábola da ovelha,
Uma do grupo das cem.

O Inimigo terrível dilacerou-a:
De chagas incuráveis a cobriu;
Por isso, não há outro remédio para as chagas
A não ser Tu, para as curar.

Em lágrimas Te suplico,
Meus gritos elevo ao Salvador:
Meu bom Pastor vindo do Céu,
Procura este pequeno rebanho.

Procura, Senhor, a moeda de prata caída
Que é a tua imagem perdida (Gn 1, 26),
Que enterrei no vício do pecado
E na lama fétida.

Lava, Senhor, esta minha imundície;
Torna-me pura a alma, de uma brancura de neve (Is 1, 18).
Digna-Te completar o número das dez moedas,
Como o fizeste com os quarenta santos [de Sebaste].

Leva-me aos ombros, pois que aos ombros carregaste a cruz,
Digna-Te reerguer esta minh’alma caída;
Darás alegria à celeste armada dos anjos
por um só pecador que regresse.
 
 
Fonte: Evangelho Quotidiano

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Comentário do Evangelho do dia (05/11) feito por Santa Teresinha do Menino Jesus




(1873-1897), carmelita, doutora da Igreja
Carta 197 de 1896/09/17



«Qualquer de vós, que não renunciar a tudo o que possui, não pode ser meu discípulo»

Minha querida irmã, como pode perguntar-me se lhe é possível amar o Bom Deus como eu o amo? […] Os meus desejos de martírio nada são, não são eles que me dão a confiança ilimitada que sinto em meu coração. Na verdade, as riquezas espirituais tornam-nos injustos, quando repousamos nelas com complacência e acreditamos que são algo grande. […] Eu sinto que […] o que agrada ao Bom Deus na minha alminha é Ele ver que amo a minha pequenez e a minha pobreza, é a esperança cega que tenho na sua misericórdia. Esse é o meu único tesouro. […]

Ó minha querida irmã […], perceba que, para amar Jesus, […] quanto mais fraco se é, sem desejos, nem virtudes, mais se está preparado para as operações deste Amor consumidor e transformador. O simples desejo de ser vítima já é suficiente, mas é preciso o consentimento para permanecer pobre e sem poder, e isso é difícil porque «onde encontrar o verdadeiro pobre em espírito? Devemos procurá-lo longe», disse o salmista. Ele não diz que se deve procurar entre as grandes almas, mas «longe», quer dizer, na baixeza, no nada.

Permaneçamos portanto longe de tudo o que brilha, amemos a nossa pequenez, amemos não sentir nada, e então seremos pobres em espírito e Jesus virá procurar-nos; por mais longe que estejamos, Ele nos transformará em labaredas de amor. Oh, como gostaria de poder fazer-lhe entender o que sinto! Só a confiança, e nada mais que a confiança, deve levar-nos ao Amor. O medo não leva à Justiça? (À justiça severa como a que se apresenta aos pecadores, mas não a esta justiça que Jesus terá para aqueles que O amam.) Uma vez que vemos o caminho, caminhemos juntas. Sim, eu sinto-o, Jesus quer dar-nos as mesmas graças, quer dar-nos gratuitamente o seu Céu.
 
Fonte: Evangelho Quotidiano

Comentário do Evangelho do dia (04/11) feito pela Beata Teresa de Calcutá




(1910-1997), fundadora das Irmãs Missionárias da Caridade
«Não há maior amor»



                         «Sai imediatamente às praças e às ruas da cidade e traz os pobres»

O pobre não tem somente fome de pão; também tem uma terrível fome de dignidade humana. Nós temos necessidade de amor e de existir para alguém. E é aí que cometemos um erro sempre que empurramos as pessoas para baixo. Não só recusámos aos pobres um pedaço de pão, como além disso, ao considerá-los como nada, abandonando-os na rua, lhes recusamos essa dignidade que é sua, de pleno direito, enquanto filhos de Deus. Hoje em dia, o mundo não tem fome só de pão, mas também de amor; tem fome de ser desejado, de ser amado. As pessoas têm fome de sentir a presença de Cristo. Em muitos países, há de tudo em abundância, excepto essa presença, essa benevolência.

Há pobres em todos os países. Há continentes em que a pobreza é mais espiritual que material: é uma pobreza feita de solidão, de desalento, de ausência de sentido. Mas também nas ruas da Europa e da América vi pessoas na maior miséria, a dormir em caixas de papelão, vestidas de trapos. Tanto Paris como Roma e Londres conhecem essa forma de pobreza. É tão simples falar sobre os pobres que estão longe ou preocuparmo-nos com eles. É mais difícil, e quiçá um desafio maior, prestar atenção e preocuparmo-nos com o pobre que vive a dois passos da nossa casa.

O arroz, o pão que dou ao esfomeado que encontro na rua acalmar-lhe-ão a fome. Mas é muito difícil saciar a fome daquele que vive na exclusão, na falta de amor e cheio de medo. Vós, que viveis no Ocidente, muito mais que a pobreza material, conheceis a pobreza espiritual e é por isso que os vossos pobres estão entre os mais pobres. Entre os ricos, há muitas vezes pessoas espiritualmente muito pobres. A meu ver, é fácil alimentar quem tem fome ou dar dormida a um sem-abrigo. Mas consolar, apagar a amargura, a cólera e o isolamento que resultam da indigência espiritual, isso exige muito mais tempo.
 
Fonte: Evangelho Quotidiano

Comentário do Evangelho do dia (03/11) feito por São Gregório de Nazianzo




(330-390), bispo, doutor da Igreja
Sobre o amor aos pobre, 4-6; PG 35, 863



       «Agindo assim ensinaste o teu povo que o justo deve ser amigo dos homens» (Sb 12,19)

O primeiro e o maior dos mandamentos, o fundamento da Lei e dos Profetas (cf Mt 22,40), é o amor que, no meu parecer, dá a sua maior prova através do amor aos pobres, da ternura e da compaixão pelo próximo. Nada honra tanto a Deus como a misericórdia, pois nada se Lhe assemelha tanto. «A rectidão e a justiça são a base do teu trono» (Sl 89,15) e Ele prefere a misericórdia ao juízo (cf Os 6,6). Nada como a benevolência entre os homens para atrair a benevolência do Amigo dos homens (cf Sb 1,6); a sua recompensa é justa, Ele pesa e mede a misericórdia.

Temos de abrir o nosso coração a todos os pobres e a todos os infelizes, sejam quais forem os seus sofrimentos. É esse o sentido do mandamento que nos pede: «Alegrai-vos com os que se alegram, chorai com os que choram» (Rom 12,15). Sendo nós também homens não será conveniente sermos benevolentes para com os nossos semelhantes?
 
 
Fonte: Evangelho Quotidiano

Comentário do Evangelho do dia (02/11) feito por Santo Agostinho




(354-430), bispo de Hipona (Norte de África), doutor da Igreja
Sermão 34; CCL 41, 423-426.


«Eu Te bendigo, ó Pai»

Somos convidados a «cantar ao Senhor um cântico novo» (Sl 149,1). É o homem novo que conhece este cântico novo. O cântico é alegria e, se reflectirmos um pouco, trata-se de um cântico de amor: quem sabe amar a vida nova conhece este cântico novo. Por isso, temos de saber o que é a vida nova, para podermos entoar este cântico novo. Tudo aqui pertence ao mesmo Reino: o homem novo, o cântico novo, a nova Aliança. O homem novo entoará um cântico novo e pertencerá à nova Aliança. […]

Dirás: «Eu canto esse cântico.» Cantas, sim, cantas e eu ouço-te. Mas toma cuidado para que a tua vida não contradiga a tua língua. Canta com a voz, canta com o coração, canta com a boca, canta com a tua conduta, «canta ao Senhor um cântico novo». Perguntas o que hás-de cantar Àquele que amas […], e que louvores poderás cantar-Lhe? Canta «os seus louvores na assembleia dos crentes» (Sl 149,1 Vulg). O louvor a cantar é o próprio cantor. Queres cantar louvores a Deus? Sê tu próprio aquilo que cantas. Tu serás o seu louvor, se viveres bem.
 
 
Fonte: Evangelho Quotidiano

quarta-feira, 1 de outubro de 2014

A Obediência Perfeita


        Diz o senhor no evangelho: quem não renunciar a tudo que possui não poderá ser meu discípulo ( Lc 14,33); e : quem quiser salvar sua vida, perdê-la-à (Lc 9,24). abandona tudo o que possui e perde seu corpo aquele aquele que se oferece totalmente á obediência na mãos de seu prelado. E aquilo que faz e diz, que saiba não ser contra a vontade dele, na condição de que seja bom o que ele faz, é verdadeira obediência. E se o súdito vê coisas melhores e mais úteis à sua alma do que aquelas que as suas [opiniões] a Deus; procure, porém, realizar em obras as que são do prelado. Pois, esta é a verdadeira obediência caritativa ( cf. 1Pd 1,22), porque satisfaz a Deus e ao próximo.
       Se o prelado, porém, ordena contra sua alma, conquanto não lhe obedeça, não o abandone. E se por causa disso vier a sofrer perseguições por parte de alguns, ame-o mais ainda por amor de Deus. Pois, quem prefere sofrer permanece verdadeiramente na perfeita obediência, porque expõe a sua vida (cf. jo 15,13) em favor dos seus irmãos. De fato, muitos são religiosos que, sob pretexto de ver coisas melhores do que as que seus prelados ordenam, olham para trás ( cf. 9,62) e voltam ao vômito da própria vontade ( cf. Pr 26,11;2Pd 2,22); estes são homicidas e causam a perdição de muitas almas por causa de seus maus exemplos.

Retirado do livro: Escritos de São Francisco de Assis, P. 34-35.

sexta-feira, 19 de setembro de 2014

Todas as graças nos são dadas pelas mãos de Maria Santíssima

 
Por Santo Afonso Maria de Ligório

 Um escritor antigo, provavelmente S. Sofrónio, num sermão sobre a Assunção de Nossa Senhora publicado com as obras de S. Jerónimo, diz que "a plenitude da Graça que está em Jesus Cristo veio sobre Maria Santíssima, embora de um modo diferente"; querendo dizer que Nosso Senhor é como a Cabeça, de Quem os espíritos vitais (ou seja, o auxílio divino para obter a salvação eterna) fluem para nós, que somos os membros do Seu Corpo Místico; e que a mesma plenitude está em Maria Santíssima, como sendo o pescoço, pelo qual passam esses espíritos vitais para os membros. A mesma ideia é confirmada por S. Bernardino de Sena, que explica isto mais claramente, dizendo que "todas as Graças da vida espiritual que descem de Cristo, a Cabeça, para os fiéis, que são o Seu Corpo Místico, são transmitidas pela instrumentalidade de Maria Santíssima." O mesmo S. Bernardino tenta atribuir uma razão para isto, ao dizer que "tal como Deus se dignou em habitar no ventre da Virgem Santíssima, Ela adquiriu, por assim dizer, uma espécie de jurisdição sobre todas as Graças; porque quando Jesus Cristo deixou o Seu sacratíssimo ventre, todos os regatos de dons divinos fluíram d’Ela como de um oceano celeste." 

Noutro lugar, repetindo a mesma ideia em termos mais distintos, ele reitera que "a partir do momento em que esta Virgem Mãe concebeu o Verbo Divino no Seu ventre, Ela adquiriu uma jurisdição tão especial, por assim dizer, sobre todos os dons do Espírito Santo, que desde então nenhuma criatura recebeu de Deus alguma Graça de outro modo que não fosse pelas mãos de Maria Santíssima."

Um outro autor, num comentário a uma passagem de Jeremias, em que o profeta, falando da Encarnação do Verbo Eterno e de Maria Santíssima, Sua Mãe, diz que "uma mulher abrangerá um homem," – e sublinha que – "assim como não se pode desenhar uma linha a partir do centro de um círculo que não passe pela circunferência, também não há Graça que proceda de Jesus, Que é o centro de todo o bem, sem passar por Maria Santíssima, Que O abrangeu quando O recebeu no Seu ventre."

Diz S. Bernardino que é por essa razão que "todos os dons, todas as virtudes e todas as graças são dispensadas pelas mãos de Maria Santíssima para quem, quando, e do modo que Lhe é agradável." Richard de St. Laurence afirma também "que é a vontade de Deus que todas as coisas boas que concede às Suas criaturas passem pelas mãos de Maria Santíssima." E assim, o Venerável Abade de Celles exorta a todos que recorram a "este Tesouro de Graças" (assim chama ele a Nossa Senhora); porque o mundo e toda a raça humana devem receber todo o bem de que tenha esperança através d’Ela apenas. "Dirigi-vos à Santíssima Virgem" – diz ele; "porque por Ela, e n’Ela, e com Ela, e d’Ela, o mundo recebe, e virá a receber, todo o bem."

Ora, deve ser evidente para todos nós que, quando esses Santos e esses autores afirmam, naqueles termos, que todas as Graças nos vêm através de Maria Santíssima, não querem dizer simplesmente que nós "recebemos Jesus Cristo, fonte de todo o bem, através de Maria Santíssima," como o escritor que nomeámos pretende; mas que eles asseguram-nos que Deus, Que nos deu Jesus Cristo, quer que todas as Graças que foram, são e hão-de ser concedidas aos homens até ao fim do mundo pelos méritos de Cristo, sejam dispensadas pelas mãos e através da intercessão de Maria Santíssima.

Livro Glórias de Maria
Fonte: http://www.fatima.org/port/crusader/cr97/cr97pg77.pdf

 

terça-feira, 9 de setembro de 2014

Natividade da Santíssima Virgem Maria




Como a santíssima Virgem é saudada com as palavras "cheia de graça" (Lc 1, 28) – isto é kekaritoméne e "bendita entre todas as mulheres", claramente se manifesta com essas palavras, como aliás sempre a tradição católica entendeu, que, com essa singular e solene saudação, nunca até então ouvida, se quer significar que a Mãe de Deus foi a sede de todas as graças divinas, e ornada com todos os carismas do Espírito Santo, e, mais ainda, com o tesouro quase infinito e inexaurível abismo deles, de tal forma que nunca esteve sujeita à maldição. (2)

9. Os santos Padres, desde os primeiros anos da Igreja, claramente ensinaram esta doutrina, sem que nenhum a contradissesse, e afirmaram que a santíssima virgem Maria foi "lírio entre espinhos, terra absolutamente intacta, imaculada, sempre bendita, livre de todo contágio do pecado, lenho incorruptível, fonte sempre límpida, a única e a só filha da vida e não da morte, o germe não da ira mas da graça, completamente ilibada, santa, alheia a toda espécie de pecado, mais bela que a beleza, mais santa que a santidade, a única santa, superior a todos, com exceção de Deus, por natureza mais bela, mais formosa, mais santa que os próprios querubins, serafins e todo o exército dos anjos".(3)

10. Considerados diligentemente, como convém, esses louvores da bem-aventurada virgem Maria, quem ousará duvidar de que aquela que é mais pura que os anjos, que sempre permaneceu pura(4), estivesse sujeita a qualquer espécie de pecado, em qualquer momento, por mínimo que fosse? Com toda a razão s. Efrém se dirige ao divino Filho dela com estas palavras: "Na realidade, só vós e vossa Mãe é que sois completamente belos. Não há em vós, Senhor, e nem em vossa Mãe mancha alguma".(5) Com essas palavras, claramente se vê que entre todos os santos e santas, somente de uma se pode dizer, quando se fala de qualquer mancha do pecado, que nem sequer é possível a questão, e que este singularíssimo privilégio, a mais ninguém concedido, o alcançou do Senhor, porque foi elevada à dignidade de Mãe de Deus. Com efeito, esta excelsa missão que foi solenemente reconhecida e sancionada no Concílio de Éfeso contra a heresia de Nestório,(6) e acima da qual nenhuma outra maior parece existir, exige a graça divina em toda a sua plenitude e a alma libertada de qualquer mancha e requer, depois de Cristo, a mais alta dignidade e santidade. Na verdade, dessa sublime missão da Mãe de Deus, nascem, como duma misteriosa e limpidíssima fonte, todos os privilégios e graças que adornam, duma forma admirável e numa abundância extraordinária, a sua alma e a sua vida. Por isso, com razão declara s. Tomás de Aquino: "A bem-aventurada virgem Maria, pelo fato de ser Mãe de Deus, tem do bem infinito, que é Deus, certa dignidade infinita".(7) E um ilustre escritor desenvolve e explica esse mesmo pensamento, com estas palavras: "A bem-aventurada virgem Maria... é Mãe de Deus: por isso, é puríssima e santíssima, de tal maneira que, depois de Deus, não podemos conceber outra pureza maior".(8)

11. Mas se considerarmos atentamente as coisas e principalmente se atendermos ao profundíssimo e suavíssimo amor com que Deus, sem dúvida, amou e continua a amar a Mãe de seu unigênito Filho, como poderemos pensar sequer que ela esteve, ainda que por brevíssimo tempo, sujeita ao pecado e privada da graça? Na realidade, Deus podia conceder-lhe, em atenção aos merecimentos do Redentor, esse singular privilégio; por isso, nem sequer podemos pensar que não o tenha feito. Convinha, na verdade, que a Mãe do Redentor fosse o mais digna possível dele. Ora, se Maria fosse manchada com o pecado original, ainda que só no primeiro instante da sua concepção, não seria digna, porque estaria sujeita ao triste domínio do demônio.

12. Nem se diga que por esse motivo se diminui a redenção de Cristo, porque não se estenderia a toda a descendência de Adão, e que, por isso, algo seria tirado ao múnus e à dignidade do Divino Redentor. Se considerarmos profunda e diligentemente essa questão, na realidade, facilmente verificamos que Cristo Senhor nosso, de fato, remiu, e de forma perfeitíssima, sua Mãe, pois que Deus a preservou de toda a mancha hereditária do pecado, no primeiro momento da sua conceição, em atenção aos merecimentos de Cristo. Por isso, a infinita dignidade de Jesus Cristo e o múnus da sua redenção universal não diminuem nem se enfraquecem com essa questão doutrinal, mas, ao contrário, muito se elevam.


Fonte: http://www.vatican.va/holy_father/pius_xii/encyclicals/documents/hf_p-xii_enc_08091953_fulgens-corona_po.html#fn3

Carta Encíclica "Fulgens Corona", do Papa Pio XII
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